quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Castelo de Cardiff: onde os séculos cantam o espírito maravilhoso medieval

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






O castelo de Cardiff (Castell Caerdydd em galês, língua local derivada do celta) é um castelo medieval largamente reformado em estilo neogótico no século XIX.

Hoje ele fica no bairro Castle Quarter de Cardiff, capital de Gales, Grã Bretanha.

Nas longínquas origens encontramos um castro – ou quartel – romano do século III de forma retangular que garantia o domínio do Império Romano e combatia os piratas.

Em 1081, ou 1091, século XI, Guilherme o Conquistador, duque da Normandia (França), desembarcou nas ilhas britânicas para tomar posse do trono herdado de Santo Eduardo o Confessor, por instâncias do Papa São Gregório VII.

Guilherme tornou-se rei e mandou construir a primeira fortaleza medieval sobre as ruínas romanas.

O castelo passou a ser o centro da marca, ou marquesado, de Glamorgan.

Esse castelo, como acostumava ser no início da Idade Média, era de madeira. No século XII foi reconstruído todo em pedra, provavelmente por Roberto de Gloucester. Foi ainda ampliado nos séculos seguintes.

Cardiff era uma peça estratégica nas lutas pelo domínio de Gales. De onde seu caráter decididamente militar.

Com a pacificação geral dos espíritos promovida pela Igreja, no fim da Idade Média as guerras foram diminuindo.

Os descendentes dos belicosos senhores, herdeiros de costumes pagãos e amantes das guerras sem fim, foram reformando as antigas fortalezas pondo o acento na cultura e no requinte que o catolicismo inspira.

Tinham ficado para trás as lutas contra os ferozes vikings pagãos e as disputas dos gauleses contra os ingleses. Porém, vieram outras, infelizmente muito piores.

As seitas protestantes, de tendências republicanas, desencadearam a Guerra Civil Inglesa contra a Coroa e especialmente contra os católicos.

O castelo de Cardiff foi disputado por exércitos a serviço do Parlamento dominado pelos protestantes fanáticos e retomado pelos monarquistas, divididos em anglicanos e católicos.

Após várias perdas e recuperações de lado a lado e tendo predominado os monarquistas, a vitória do protestantismo ‘parlamentar’ significou grave perigo para o castelo.

De fato, ele poderia ser destruído em vingança pelos vencedores. Porém, foi salvo pela sua estratégica posição militar, pois era ponto defensivo contra invasões externas.

O feudo de Cardiff possuía grandes privilégios e era quase independente em relação à Coroa inglesa. A nobre família gaulesa Tudor acabou reinando na Inglaterra com Henrique VII, em 1485.

Seu filho, Henrique VIII, que levou Inglaterra à heresia, simplesmente anexou Gales com leis passadas entre 1535 e 1542 destruindo a independência gaulesa e muitos privilégios veneráveis.

Esse crime histórico foi perpetrado pelo ministro Thomas Cromwell, a quem São Tomás Moro acusou de ter vendido a alma por Gales. No fim, já herético, Henrique VIII mandou degolá-lo.

O castelo pertenceu às famílias Clare e Despenser durante vários séculos.

Por volta de 1550, a família Herbert herdou a propriedade e introduziu grandes melhoramentos.

Na metade do século XVIII, John Stuart, primeiro marquês de Bute, iniciou uma profunda reforma, continuada pelos seus descendentes.

Os sofridos restos medievais foram recuperados seguindo o impulso de restauração do gótico medieval.

E, de fato, segundo o historiador Megan Aldrich, a restauração de Cardiff foi “a mais magnífica recuperação do gótico jamais efetivada”.

Os marqueses de Bute, geração após geração, continuaram a obras. Porém, na II Guerra Mundial, bombardeios aéreos atingiram os muros e as instalações capazes de acolher 1.800 soldados.

Quando faleceu o último marquês proprietário, em 1947, o castelo foi doado à cidade de Cardiff.

Os medievais não se preocuparam em promover sua imagem. Aliás, suas maiores preocupações estavam aplicadas em civilizar os agitados, e por vezes sanguinários, povos pagãos e favorecer a expansão do Evangelho pregado pelos sacerdotes e monges católicos.

Paradoxalmente, o século XIX foi o que melhor interpretou e idealizou a maravilhosa gesta medieval. O castelo de Cardiff é um precioso exemplo disso.

Em Cardiff encontramos a rudes ruínas propriamente medievais dos tempos das guerras.

Mas também encontramos, cantada pela restauração do século XIX, a procura do maravilhoso que embebeu a vida medieval.

Na lareira, por exemplo, contemplamos uma escultura de um nobre partindo para o combate.

Tudo nele representa o heroísmo da partida e dos lances que aspira fazer.

Numa ameia, a dama – no gosto sentimental do século XIX – estende seu pano cheio de lágrimas ao esposo que talvez não verá mais.

O cavaleiro, entretanto, sem desconhecer o significado do gesto, continua virilmente rumo ao dever que poderá lhe custar a vida.

Nas torres e demais ameias trombeteiros fazem soar seus instrumentos para ressaltar a importância do momento.

O maravilhoso desta cena temporal medieval é ainda mais acentuado pelas numerosas esculturas de anjos que povoam os salões.

Pois o medieval tinha um fundo de alma continuamente impostado em função das mais altas realidades sobrenaturais e os artistas posteriores perceberam essa característica.

Para o medieval, nada de mais normal do que conviver com naturalidade com as potências angélicas e que estas se fizessem sentir na sua vida quotidiana.

Com maior razão eles achavam normal que os espíritos angélicos protegessem e até povoassem o castelo, símbolo do triunfo temporal da Civilização Cristã inspirada por Jesus Cristo.

Nesse sentido, os castelos mantidos por famílias nobres, fiéis à Igreja, eram também redutos angélicos.

Numa das torres refeitas encontramos uma aparente similitude com o Big Ben de Londres, pelo triunfo da policromia no topo.

Também na torre há um relógio – bem ao estilo do século XIX –, mas menor que o Big Ben.

Nela há uma como que coroa com os brasões dos nobres antepassados e figuras alegóricas representando o céu astronômico.

Para o medieval, a família era uma realidade que transpunha os séculos.

E o castelo era o escrínio onde se conservava a lembrança do passado e de todos os que antecederam os vivos na sua caminhada neste vale de lágrimas rumo à eternidade abençoada do Céu.




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quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Palácio dos Doges de VENEZA:
maravilha da Civilização Cristã

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
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Observamos o célebre Palácio dos Doges de Veneza que, pelo fato de estar a dois passos do mar, tem um especial encanto.

A cor do palácio é de difícil definição. A meu ver, ela varia um pouco de acordo com a luz do dia, por vezes parecendo de um róseo muito delicado, mas não homogêneo.

Nas ogivas góticas percebe-se a cor rósea e branca.

De acordo com a lei da gravidade, o mais pesado deve carregar o que é mais leve.

Nesse sentido, seria explicável que tal edifício fosse construído de tal maneira que essa espécie de “caixotão” róseo — é quase um ultraje chamá-lo assim, mas enfim, permitam-me a liberdade de expressão — ornado por ogivas fosse edificado diretamente sobre o solo.

Também que as colunas do andar inferior, juntamente com a colunata que toca o solo, fossem colocadas em cima do “caixotão” róseo que, entretanto, repousa sobre elas.

As ogivas estão dispostas deliciosamente simétricas, pensativas, calmas, tranquilas e nobres, parecendo estar elas mesmas contemplando o mar.

Desta maneira, por um contraste interessante, tem-se a impressão de que, construído como foi, o palácio causaria uma sensação de peso medonho, e que a qualquer momento o “caixotão” iria esmagar a colunata.

Entretanto, está calculada com tanta inteligência a distribuição dos corpos e dos volumes do edifício, que ele não causa essa impressão.

Pelo contrário, a colunata carrega sem esforço o grande “caixote”.

E ele, recusando-se a pousar na terra, é suportado por colunas magníficas, de maneira que por debaixo dele circula o ar.

A arte consiste em apresentar uma primeira série de ogivas muito bonitas; e depois, embaixo, outra linha de arcos.

Assim, o palácio parece estar suspenso no ar.

Chamo a atenção para o que há de bem pensado em cada detalhe da fachada.

Por exemplo, como ela ficaria monótona se, bem no meio, não houvesse uma porta dando acesso ao terraço.

Se figurasse ali mais uma ogiva, o palácio tornar-se-ia insuportável; e aquele terraço tem exatamente o tamanho adequado para a porta.

Eis aí alguns elementos para se analisar e contemplar bem, e de modo um tanto leve, uma das maravilhas do Universo: o Palácio dos Doges de Veneza.


(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, 2-12-1988. Sem revisão do autor).


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