quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

WARWICK: força e delicadeza, nobreza e sacralidade

Warwick: imensa fortaleza, parte em ruínas, parte refeita no estilo Belle Époque
Warwick: imensa fortaleza, parte em ruínas, parte refeita no estilo Belle Époque
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




O castelo de Warwick, na Inglaterra, considerando-se a simples formosura do conjunto arquitetônico, dispensaria comentários.

Porém sua beleza é especial, muito de acordo com o gosto anglo-saxão que inclui elementos que não são frequentes nas preferências latinas.

Sua beleza não está tanto contida em algum aspecto chamechante de cor ou forma, mas se encontra difusa discretamente pelo todo.

A imensa muralha e o conjunto de prédios que constituem o castelo em muitos lados estão em ruínas. Por vezes, são ruínas de grandes partes de muralhas ou torres.

A ruína inglesa tem uma beleza peculiar, sobretudo se a consideramos envolta nas brumas frequentes na ilha e no verde intenso dos gramados favorecidos pela umidade ambiente.

Uma torre que emerge na bruma sugere ambientes ou acontecimentos fantásticos que se verificaram outrora.

Não apenas acontecimentos históricos ou arqueológicos, mas fatos que deixaram ecos por assim dizer vivos que se movem misteriosamente nas horas escuras e brumosas.

Warwick reflete sua figura no plácido rio Avon
Warwick reflete sua figura no plácido rio Avon
História de fantasmas, de monstros misteriosos, de belíssimas damas brancas, de almas penadas de reis ou de nobres que ali viveram ou morreram em circunstâncias atormentadas ou mal conhecidas.

Os gramados, quando não são abafados pela neve invernal, costumam ser de uma cor verde esmeralda intensíssima.

Os rios que banham o castelo inglês típico correm muito mansamente. E formam espelhos d’água placidíssimos que refletem perfeitamente os monumentos cujos pés eles lambem.

No caso de Warwick é o rio Avon, que banha outros locais históricos prestigiosos. Entre eles, a cidade de Stratford-upon-Avon, onde nasceu e morou o famoso literato William Shakespeare.

Esse rio inspirou, com certeza, muitas das ambientações ricas em matizes das obras de Shakespeare.

Sob vários ângulos o Warwick parece não estar mais habitado e como que abandonado, um fator que o enriquece, segundo o gosto inglês.

Nas partes habitadas ou tornadas museu ele se mostra luxuoso e perfeitamente acabado e conservado.

Como tudo que é medieval, o conjunto emana força, nobreza e sacralidade.

Sala de jantar no castelo de Warwick
Sala de jantar no castelo de Warwick
O estilo medieval inglês é muito nobre, formoso, com forte nota de severidade temperada por detalhes subtis e delicados.

Tivemos ocasião de tratar em outro post da história do castelo, desde suas origens até o presente.

A influência do afrancesamento foi feliz para a Inglaterra e teve um efeito enriquecedor e amenizador.

Essa influência se nota muito em Warwick, como se pode apreciar na sala de jantar, por exemplo.

A esplêndida exposição de armamento medieval põe em destaque as luminosas armaduras, em contraste magnífico com a severidade dos lambris de madeira e da pedra.

O gótico do prédio sobressai no interior, embora muitos salões tenham sido refeitos no estilo do Ancien Régime francês, com seu requinte e colorido.

Sala de música do castelo de Warwick, no estilo Belle Époque
Sala de música do castelo de Warwick, no estilo Belle Époque
Belíssimos quadros antigos, cores resplandecentes na pintura e nos panos de parede nos afastam da trivialidade pardacenta dos prédios modernos.

As figuras de cera recriam a vida brilhante e também superficial da Belle Époque, a qual acabou morrendo durante a tragédia da I Guerra Mundial.

Está também no gosto inglês que os objetos como mesas e sofás sejam um pouco pesados.

Eles parecem feitos para a pessoa sentar-se durante longas horas, pensar, ler e deixar as impressões se depositarem.

Tendo o Império Inglês atingido seu ápice no período da Belle Époque, a Inglaterra importou então maciçamente obras de arte do Oriente.

De onde os lindíssimos tapetes e maravilhosos vasos de porcelana chinesa que compõem salas suntuosas e elegantes.




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quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

No castelo medieval: troca de bons ofícios

Porto de Mos, Portugal
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs








Pelo mesmo processo através do qual a família — crescendo, multiplicando-se, agregando novos membros — veio a formar a mesnada, esta deu origem ao feudo.

O feudo é pois o estágio mais evoluído da organização social de base familiar.

Compreende o barão e sua família próxima, os ramos cadetes de sua estirpe e vassalos nobres que lhe prestam auxílio, recebendo em recompensa cargos, terras ou outros bens e formando a sua parentela.

Esse todo constituía a nobreza, cuja missão era governar o feudo e combater para a sua defesa.

Capela do castelo de Warwick, Inglaterra.
Capela do castelo de Warwick, Inglaterra.
Outra classe constitutiva do feudo era o clero — capelães, monges e párocos — cuja existência era consagrada à oração, ao ensino e à assistência aos desvalidos.

Por fim o povo, formado pela burguesia (comerciantes e artesãos) e pela plebe (agricultores e servos), cuja missão era produzir o necessário para o sustento de todos.

Semelhantes a essa era a organização dos feudos eclesiásticos, ou seja, daqueles cujo senhor era o bispo ou o abade, e, no caso das Ordens femininas, a abadessa.

O castelo feudal evoluiu.

Dentro da primeira muralha protetora, entremeada de torres e circundada pelo fosso, estão a capela e as habitações de soldados, não mais construídas em madeira, mas em pedra e tijolo.

A segunda área, separada da primeira por uma nova muralha com fosso e pontes levadiças, forma uma segunda linha de defesa, abrigando as residências do senhor e sua família e dos nobres que lhe prestam serviço.

Castelo de Daroca. Castela, Espanha.
Castelo de Daroca. Castela, Espanha.
A segurança do castelo permite que o barão more num belo e amplo palácio, e não mais na torre de menagem.

Esta permanece, atrás de uma terceira muralha, como último reduto da defesa e posto de vigia.

Geralmente o castelo fica no alto de uma elevação, e a torre de menagem é colocada do lado da encosta mais escarpada, o que torna mais difícil atacá-la.

O feudo se funda, como a família e a mesnada, no amor mútuo que une seus membros.

O barão deve a seus súditos proteção, assistência e defesa.

Restos do castelo de Torrelodones, Espanha.
Restos do castelo de Torrelodones, Espanha.
Ele vela por todos nas dificuldades e exerce a justiça quando surgem conflitos.

Sua autoridade porém não é absoluta. Os costumes têm no feudo força de lei, e o barão não pode, ainda que o queira, derrogar as praxes e modificar os direitos que a tradição consagrou.

Ao seu lado, sua esposa é mãe para todos os súditos, aos quais auxilia ou aconselha nas suas necessidades, dedicando-se especialmente a ensinar e educar as jovens, até o casamento.

Os súditos devem servir com amor e fidelidade ao senhor, seguir seu conselho nas questões importantes e pedir seu consentimento para se casarem, tal como o próprio senhor feudal deverá pedi-lo ao nobre ou ao rei, do qual é ele mesmo vassalo direto.

Os súditos de mais destaque colaboram com o barão na administração da justiça e nos conselhos reunidos para as grandes deliberações.

Os deveres recíprocos estão traçados minuciosamente em juramentos religiosos, cujos textos até hoje se conservam.

Os vassalos viam a fidelidade como um dever, mas também como um benefício: “Gente sem senhor está em muito má situação” — diz um provérbio da época.

O conde Gaston Febus com caçadores. Livro da Caça, Biblioteca Nacional da França.
O conde Gaston Febus com caçadores. Livro da Caça, Biblioteca Nacional da França.
De fato, quem não tem senhor deve enfrentar sozinho as lutas e agruras da vida, nesses tempos ainda tão ásperos.

Há no feudo uma hierarquia muito variada e intrincada, e não apenas a autoridade total de um só senhor sobre uma multidão de súditos iguais.

Os nobres se dispõem em graus interdependentes, os trabalhadores podem ser súditos tanto diretamente do senhor como de algum de seus nobres, ou até de burgueses, e estes podem estar colocados na dependência deste ou daquele suserano.

Até entre os servos há uma hierarquia, com várias subordinações, havendo mesmo servos que o são de outros servos.

Os servos da gleba, dos quais tanto se tem falado, eram trabalhadores braçais fixados a uma terra que não podiam abandonar, mas da qual, em compensação, não podiam ser expulsos.

Tinham direito a proteção e auxílio e podiam exigir do senhor que os sustentasse nas épocas de crise, ao passo que em iguais circunstâncias os que eram livres chegavam a morrer de fome.

Sua condição, dura a princípio, mas aos poucos suavizada por influência da Igreja, não era uma escravidão, pois suas obrigações eram bem delimitadas e o senhor não tinha autoridade absoluta sobre eles.

Era mais ou menos como um contrato de enfiteuse vitalício e irretratável por ambas as partes.

Os servos constituíam um grau, embora ínfimo, da estrutura familiar que formou a civilização feudal.

Por isso repetiam-se entre eles e seus senhores os mesmos sentimentos de união, de devotamento e de amor que eram a base da vida social.

Nas crônicas do senhor Amis lê-se que, tendo ficado leproso, foi expulso do castelo por sua esposa, repelido pelos camponeses e posto para fora até do hospital de caridade.

Dois servos da gleba, porém, deixaram tudo para o seguir, cuidando dele como de um pai, chegando a mendigar para sustentá-lo.

Na Idade Média houve muitas vezes o espetáculo admirável de servos levantando-se em massa para irem libertar seu senhor, caído prisioneiro.


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