Agulha de Saumur (épis de faîtage em francês) foi criada com base na iluminura |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
continuação do post anterior: Da terra ao Céu: do Saumur da pedra ao Saumur do sonho
O castelo de Saumur não é um sonho de toxicômanos. O castelo tem uma harmonia e um equilíbrio que, ao mesmo tempo em que parece flutuar no ar, não dá a impressão de que vai cair.
Por causa disso ele se divide em duas partes bem nítidas: a parte superior ligeira, leve, graciosa; e a parte inferior, fortíssima.
O castelo tem como que garras postas no chão; são subterrâneos, masmorras, cofres, arquivos, salas de armas na parte fortíssima. Esta segura o castelo e o equilibra no que ele poderia ter de demais aéreo.
Se o castelo fosse todo como a parte de baixo, seria um pesadelo.
Se fosse tudo como é em cima, seria uma brincadeira.
Mas ele não é nem um pesadelo, nem uma brincadeira. É uma obra-prima de equilíbrio de espírito, em que cada coisa tem seu papel.
O que toca na terra é sólido, sério, vigoroso, guerreiro. São muralhas de uma fortaleza. De quando em quando há uma seteira. Não há janela.
Há uma rampa de acesso com uma ponte levadiça e mais muralhas, de maneira que se alguém quiser entrar burlando esse esquema, encontra muralhas dentadas de onde podem ser jogadas setas, água em ebulição, óleo, pedras.
A conjunção na elevação do nobre e do popular |
Assim o castelo é prudentíssimo nas realidades terrenas, mas é santamente idealista nas coisas superiores.
O burrico que vai descendo mostra o gosto medieval pela vida quotidiana na sua plenitude. Inclui seus aspectos mais elevados e os mais prosaicos também.
Porém, o pragmático se ordena em função do elevado, e o sombrio e o prosaico se regeneram; ficam delicados e a gente sorri, vendo o burrico descer.
Se há um animal que não tem graça é um burrico. Mas aqui ele fica engraçadinho como num presépio de Natal.
Uma camponesa leva um peso qualquer na cabeça. A cor do vestido dela é clara, seu passo é leve. Ela se sente bem. É o equilíbrio que formam os opostos não contraditórios juntando-se uns aos outros.
Exemplo de castelos que poderiam ter existido |
Todas as realidades da vida estão consideradas com espírito católico. O que domina tudo é o desejo do Céu, dos bens do espírito, e as partes materiais existem para atender aos bens do corpo.
É a magnífica e harmônica visão global do universo que a Igreja Católica nos dá.
Há um convívio da aristocracia com a plebe, do gênero humano com o reino animal e o vegetal.
Tudo tão bem posto que lembra o Gênesis, onde diz que após criar o mundo Deus repousou, considerando que cada coisa era boa e o conjunto era melhor ainda.
Na iluminura pode-se dizer que cada parte é boa, mas o melhor é o conjunto todo, inclusive o burrinho.
Se não foi construído pelo rei São Luís IX, é histórico que foi usado por ele.
São Luís era o tipo de rei capaz de inspirar um arquiteto e mandá-lo construir esse castelo. A santa alma de São Luís está inteira dentro da iluminura.
São Luís ofereceu um histórico banquete em Saumur |
O centro psicológico da face são os olhos.
Em Saumur, parece que nós sentimos o olhar de São Luís.
Essa iluminura descreve mais sobre São Luís do que muitas pinturas que tentam representar sua face.
No século XIX, o rei Luís II, da Baviera teve o desejo de realizar algo assim nos castelos que ele construiu, como o famoso Neuschwanstein.
Mas não conseguiu, seus arquitetos fizeram coisas, mas quão inferiores!
Saumur é único. É o castelo medieval por excelência, a imagem plena da Idade Média!
Assim como a Suma Teológica dá inteiramente a ideia da teologia medieval, Saumur dá ideia do espírito medieval, ou seja, do melhor brilho do espírito católico.
Comparemos mentalmente esse castelo com algum prédio moderno. Que graça tem o arranha-céu de Manhattan em comparação com Saumur?
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